domingo, 29 de março de 2015

O trajeto

Há dois anos, fui convidado para uma missão prazerosa, e a meu ver edificante. Minha primeira nora me fez um pedido, e mesmo que eu procurasse disfarçar, ficaram visíveis minha alegria e satisfação ao ouvir dela a frase: - O senhor pode buscar o Pedro lá no colégio pedro II, às 18 horas? Fiquei por alguns segundos calado, tal foi minha emoção. Respirei fundo e respondi: -Claro que posso! Como nunca havia viajado de barca, a missão tornou-se uma mistura de conhecimento e aventura aos 69 anos.
No primeiro dia , me preparei ainda cedo, já que a barca sairia as 16:20H, armei-me com meu cartão RIOcard e parti para estação no Cocotá. Cheguei muito cedo, fiquei esperando cerca de vinte minutos, passei meu cartão e sentei num dos bancos a fim de aguardar a liberação da entrada.
Tudo era novidade, a estação  confortável, os funcionários educados, um lugar cuja temperatura não passa dos 30°. Embarquei na parte de cima, onde a visão da Baía de Guanabara proporcionava uma contemplação no mínimo deslumbrante. Passei a observar com curiosidade de pricipiante, olhando o cenário  durante todo o trajeto.
Atracamos na estação Praça Quinze. Antes do desembarque vi o pouso de uma aeronave no Santos Dumont, vi o Pão de Açúcar e o Cristo de braços abertos para todos que chegam à cidade. Ao caminhar para a avenida Marechal Floriano (com uma breve pesquisa na internet, descobri que essa rua também é conhecida como Rua Larga de São Joaquim) havia muita poeira devido à demolição do elevado da Perimetral.
Atravessei a Praça XV de Novembro, passando pela estátua de Manuel Luís Osório, até parar em frente às duas igrejas católicas seculares construídas na época que a avenida Primeiro de março, entre eu e as igrejas, se chamava rua Direita. Já escurecia quando apressei o passo, entrando pela rua do Ouvidor, onde funcionavam as antigas Gafieiras e alguns bordéis. Dobrei a direita na rua da Quitanda rumo à igreja da Candelária, e por curiosidade, como ainda dava tempo, resolvi visitar seu interior. Logo na entrada fui tomado por um calafrio diante da beleza e perfeição daquelas pinturas e esculturas, das imagens seculares retratadas, mensagens que atravessaram o tempo e que naquele dia sussurravam silenciosas aos meus ouvidos seus belos poemas feitos sob a luz e a sombra que ainda dançavam sob pincéis, cinzéis e martelos atemporais daqueles artistas. Viajei mentalmente à  época em que as obras foram produzidas e fiquei por alguns instantes a ouvir o burburinho das conversas de seus autores em minha imaginação.
Saí da igreja encantado, deslumbrado com tanta perícia e beleza. Segui em frente, pois uma pequena igreja lá na esquina da avenida anunciava em badaladas de sino que já eram seis horas. Apressei o passo e finalmente cheguei ao famoso colégio Pedro II. Na entrada, um guarda bem uniformizado perguntou se podia ser útil, expliquei o motivo de minha presença e ele me orientou que esperasse, pois a turma já tinha sido liberada. Enquanto esperava, fiquei postado diante de uma escada muito antiga feita ferro fundido e madeira entalhada, que imaginei ser obra de antigos artesões, e visualizei também um quadro com fotos de ex-alunos e presidentes que estudaram no educandário famoso. Entre os que aguardavam, ansiedade.
Enfim me sai Pedro, meu neto, como sempre tranquilo.
-Oi vô.
-Oi pedro, tudo bem?
Perguntei , ofereci um lanche que trouxe de casa, dois hambúrgueres caseiros e duas garrafas de suco, ele consumiu a metade deixando o resto para a viagem de retorno.
Voltamos apressados com receio de perder a barca de 18:40H, a estação estava lotada quando o portão abriu. Foi uma correria.
-Vamos vô!
Entramos rapidamente na barca e conseguimos pegar um lugar próximo à janela, já que Pedro tem preferência pela janela. Fiquei ao seu lado, perguntei como foi o dia na escola, ele gosta de usar um vocabulário curto.
-Tudo bem, respondeu.
No trajeto de volta ele começou a contar como foi sua aula de ciências. Enquanto ele falava de bactérias, vírus e infecções, eu ouvia com atenção em meio à bela paisagem noturna. Os navios todos iluminados. Começamos a passar sob o grande arco de concreto e aço, a ponte Presidente Costa e Silva, chamada de ponte Rio-Niterói, que a noite transformara num grande arco neon com as cores dos faróis dos carros que passam. Já chegando à ilha do governador, para fechar o trajeto, olho à esquerda e vejo iluminada sob um brilho amarelado a igrejinha do Morro do Ouro.

Observe você também a singularidade desse trajeto. Vá de dia à cidade e volte a noite para a Ilha do Governador, a terra dos Maracajás. A cidade dos Cariocas é sem sombra de dúvidas maravilhosa, não só pela sua beleza, mas também pelo seu acervo histórico e cultural.

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